Crenças e Superstições libanesas

Num país tão religioso e repleto de expressões simbólicas de fé como o Líbano, é curioso observar como existem superstições antigas, praticadas e passadas de geração para geração, que continuam presentes na vida da sociedade; principalmente entre os idosos, que acreditam que certos objetos podem afastar maus espíritos, mau olhado e dar-lhes proteção.

E é sobre isso que vou falar um pouco hoje, começando pelos gatos pretos, que os libaneses acreditam trazer má sorte.

No ano passado, a agência Impact BBDO de Dubai, em parceria com a Loto Libanesa, realizou uma grande campanha em todo o país com a hashtag “GoodbyeBadLuck”, para reunir o maior número possível de gatos pretos existentes. A campanha começou com uma pesquisa nacional na imprensa, com divulgação massiva em rede nacional no horário nobre, pedindo às pessoas que ligassem para a central telefônica da Loto libanesa sempre que encontrassem um gato preto.

A remoção dos gatos pretos foi realizada por uma equipe especialmente treinada, com o apoio dos funcionários municipais, do Conselho Médico Libanês e do hospital e pet shop “Animal Care”. Todos os gatos foram deportados para a Nova Zelândia, onde ao contrário do Líbano, a população acredita que os gatos pretos trazem sorte. Hahaha… parece piada, mas aconteceu!!!

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Voltando à outras superstições libanesas….

De acordo com as tradições populares, os espíritos mais comuns são descritos como sendo invisíveis para os seres humanos, mas afirma-se que eles podem ser do bem, do mal ou neutros. Paralelo às suas próprias e distintas crenças religiosas, muitos libaneses ainda acreditam em tais superstições e mantêm amuletos e talismãs da sorte, usados para expulsar os maus espíritos ou reverter feitiços, e que são facilmente encontrados em lojas de perfumes, cosméticos e bijuterias. São os chamados “attars”.

Os “attars” são vendidos e vêm acompanhados de conselhos oferecidos pelos lojistas sobre quais ítens seriam melhores para resolver uma determinada situação, além de como ele deverá ser usado. Mas é fato também, que a maioria destes ítens é comercializada mais a título de decoração do que necessariamente para fazer o bem ou o mal, ou tampouco para reverter e quebrar algum feitiço ou algo do gênero.

Há quem procure por coisas estranhas, assim como há quem busque apenas por algum amuleto específico, com seu próprio intento. E há ainda, os que procuram por essas lojas em busca de algo, mas já trazem consigo as suas próprias e inacreditáveis histórias. Como por exemplo, uma pessoa que busca pelo talismã de “peixe-voador” para expulsar espíritos malignos. Muitos acreditam na existência desses espíritos e, em muitos casos, eles são mais bem tratados, ou sagrados, do que os próprios amuletos e talismãs em si.

O peixe-voador é encontrado no Mediterrâneo. Segundo a crendice libanesa, depois de seco ele é pendurado no quarto das mulheres que sofreram um aborto espontâneo, por acreditar-se que os abortos espontâneos são causados por espíritos malignos. A crença no amuleto alega sua eficiência e ele é usado por muitas famílias, há muitas gerações, pois “Deus o criou com esse propósito”, alegam os supersticiosos. O amuleto do peixe-voador custa aproximadamente LL 20,000.

Outro ítem muito procurado é a “estrela do mar” seca, vendida por LL 7,000 e que segundo a crença, ao ser pendurada nas residências trás boa sorte e felicidade, além de ser decorativa. Os amuletos de cor azul podem ser meramente decorativos também, mas muitas pessoas os penduram nas casas, acima das portas, dentro dos carros, com o intuito de evitar acidentes. Geralmente, eles vêm acompanhados de algum provérbio escrito como: “O invejoso pode ficar cego”, por exemplo.

De acordo com algumas pessoas, a história do amuleto de ferradura começou com duas tribos de combate, onde o chefe de uma delas pediu àqueles que não quisessem lutar para pendurarem uma ferradura acima de suas portas, afim de trazer segurança. E desde então, a ferradura vem sendo pendurada na intenção de trazer segurança e proteger a casa da destruição, da inveja e da morte.

Um amuleto azul em forma de palma aberta com um olho no meio também é muito popular em todo o Oriente Médio, usado como forma de afastar o mau olhado. O número 5 na tradição árabe é relacionado a afastar o mal olhado e este amuleto é conhecido  como “khamsa” (cinco em árabe).

Algumas pessoas fazem também bom uso da “raqwa”, que consiste em queimar um incenso e movê-lo em torno da pessoa que se acredita estar sendo invejada pelo olho do mal, enquanto são recitados alguns versos do Corão, ou algumas frases tradicionais destinadas a afastar o mal.

Essa água às vezes também pode ser ingerida, e até mesmo uma dor de estômago ou de cabeça pode ser vista como “vítima de mal olhado”. Outro procedimento usado para curar a pessoa desse mal, consiste em derreter chumbo numa colher e despejá-lo sobre uma tigela de alumínio com água sobre a cabeça da pessoa, repetindo o processo três vezes.

Há uma lenda urbana libanesa também, que diz que cobrir o corpo de um recém-nascido com sangue de morcego impedirá que a pessoa tenha pêlos em seu corpo no futuro. As opiniões à cerca dessa prática divergem. Alguns alegam que isso é apenas uma crendice antiga sem fundamento, outros afirmam sua eficácia e veracidade.

A classe médica libanesa também se divide nessa questão; uns afirmam existir propriedades anti-pêlos no sangue do morcego, outros descartam a existência de qualquer fundamento nessa prática, alertando sobre os perigos que isso pode trazer ao recém-nascido, como por exemplo, o risco de transmissão da raiva.

Outra crença popular está relacionada ao “Eid El Barbara”, comemorado anualmente em 4 de dezembro por cristãos libaneses, sírios jordanianos e palestinos. A celebração é devotada à Santa Barbara, cuja lenda diz que a mártir teria se disfarçado de muitos e diferentes personagens para iludir os romanos que a perseguiam.

Todavia no Líbano, embora a tradição cristã esteja envolta na data, inclusive com pratos e doces específicos preparados apenas nesse dia (entre outras práticas que se estendem até o Natal), o evento se assemelha muito às tradições do Halloween americano. As crianças se fantasiam e saem de porta em porta, tocando tamborins e cantando “Heshle Burbara” (Barbara está fugindo), cuja letra incita o dono da casa a poupar algumas moedas (aqui substituídas por doces e guloseimas), em troca de boa sorte.

Essas são apenas algumas das superstições e crenças libanesas e histórias populares; mas há muito mais, inclusive em cada região e comunidade religiosa. Há sempre algo novo e inusitado à aprender.